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Como nascem os bebês ‘reborn’?

Nova ‘febre’ domina as redes sociais com o realismo dos bonecos, que trazem delicado trabalho artesanal

Natasha Werneck
18/05/2025 | 08:45
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FOTO: Celso Luiz/DGABC


Uma febre silenciosa que nasceu na arte e ganhou fôlego com as redes sociais. Os bebês reborn – bonecos hiper-realistas que imitam recém-nascidos – deixaram de ser itens de nicho para se tornarem protagonistas de polêmicas, memes, coleções e até terapias. Mas afinal, de onde nascem esses ‘bebês’?

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Quem responde é Érica Faria, 46 anos, artesã de Santo André e uma das maiores referências no Brasil na confecção artesanal desses bonecos. Conhecida como ‘a cegonha das celebridades’, ela já entregou bebês reborn para nomes como Fabiana Justus, Deolane Bezerra, Gracyanne Barbosa, Wesley Safadão, entre outros.

“O meu processo é todo artesanal. Pinto camada por camada, implanto cabelo fio a fio, faço sobrancelha com pincel de um fio só. Cada detalhe importa, porque a proposta é a máxima semelhança com um bebê de verdade”, explica Érica, que produz cerca de 20 bonecos por mês em seu ateliê, faturando uma média de R$ 15 mil mensais.

A produção, segundo ela, envolve 188 itens, desde colas e cílios até tintas especiais, vernizes e tipos específicos de cabelo humano. “Tenho lista com tudo que vai em cada bebê. Parece simples, mas não é. É minucioso, é arte pura.”

TERAPIA

A história de Érica com os reborn começa com uma recomendação médica. “Eu era feirante há mais de 20 anos. Passei por uma situação difícil emocionalmente, e um psicoterapeuta me sugeriu fazer algo fora da rotina”, conta. A lembrança de uma reportagem sobre os bebês reborn reacendeu a curiosidade e a levou a buscar cursos — primeiro no Brasil, depois nos Estados Unidos. “Fiz cursos aqui, mas ainda queria mais. Em 2017, fui para os EUA fazer um de técnica avançada de pintura.”

O hobby virou paixão, que virou profissão. “Comecei fazendo um para minha filha mais nova, que hoje tem 15 anos. Quando vi, já estava tomando conta da minha rotina. Tive que largar a feira.”

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DETALHES

Os bebês nascem de kits — moldes de vinil ou silicone que simulam cabeça, membros e tronco de recém-nascidos. Érica utiliza majoritariamente o vinil. “É mais indicado porque dá manutenção. Se estragar, dá para trocar só uma parte. O silicone sólido é muito mais caro e não permite reparos.”

A pintura é feita com tintas específicas para vinil, em várias camadas, até atingir o tom de pele desejado. “Tem veia, marca de vacina, até marca do teste do pezinho. É tudo pensado para parecer o mais real possível”, explica. O cabelo é implantado fio a fio, com agulhas de precisão. “A sobrancelha é o ponto que mais diferencia um bebê. É o que dá vida. Por isso, só eu faço essa parte.”

Além da produção, Érica também oferece cursos de formação para novos artistas reborn, com investimento de R$ 4.500. “Tem muita gente querendo aprender. Mas precisa ter paciência e dedicação”, aconselha.

MERCADO EM ALTA

Apesar das críticas recentes nas redes sociais – que associaram os bonecos a distúrbios emocionais –, Érica garante que a polêmica só fez crescer as vendas. “Essa semana, desde que estourou a discussão, foi uma das que eu mais vendi. Nem na pandemia, quando chegamos a 70 bonecos por mês, foi assim.”

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Os bebês custam, em média, de R$ 1.700 a R$ 3.000, podendo passar disso dependendo do grau de personalização. Réplicas de filhos, por exemplo, são mais caras. “Tem mãe que quer um bebê igual ao filho que morreu. Tem bebê com vitiligo, com síndrome de Down, com marcas de nascença. Tudo isso exige mais detalhes, mais trabalho.”

Além de itens de coleção ou brinquedos, os reborn têm ganhado espaço na área da saúde. “Já fiz bebê para teatro, filme, laboratório, simulação de parto, primeiros socorros... E também para terapia. Crianças com autismo, TDAH, idosos com Alzheimer... os relatos que recebo são emocionantes”, diz.

Apesar da aparência realista, Érica destaca que o limite entre arte e fantasia precisa ser respeitado. “Tem gente que compra leite, fralda, roupa como se fosse um bebê de verdade. Gasta mesmo. A gente sabe que tem exageros, mas isso não pode apagar a beleza da arte que está por trás.”

Fábrica produz 60 brinquedos por dia

Saindo de uma produção sob encomenda e mais personalizada para outra em escala maior e mais “popularizada”, está um negócio comandado por Tiago Gomes, 42, e sua mulher, Nurya, 36, em Marília, no Interior de São Paulo. De lá saem cerca de 60 bonecos por dia, todos feitos à mão por uma equipe de artesãos, que chegam ao quiosque no Grand Plaza Shopping, em Santo André, e várias outras lojas.

O casal começou vendendo produtos infantis importados. Um dia, trouxe um boneco reborn da China, sem saber ao certo do que se tratava. “A gente conheceu esse mundo dos reborn importando bonecas da China, que vinham com esse nome, mas não eram bebês reborn de verdade. E, conforme fomos nos aprofundando, descobrimos que os kits de verdade – até então – só eram comprados dos Estados Unidos ou da Europa”, disse Tiago ao Diário.

A curiosidade virou negócio. “A gente foi entrando nesse ramo e conhecendo mais, até que começamos a querer produzir nossas próprias bonecas”, conta Tiago. Hoje, a empresa é uma das únicas do País que produz o kit cru – cabeça, braços e pernas – desde o molde original.

CRIAÇÃO

 processo é minucioso. “A gente se inspira em fotos de bebês reais, entrega essa ideia para um escultor que modela em cera. Depois, um ferramenteiro transforma isso numa forma de cobre. Com essa forma, fazemos a mistura – resina, plastificante, silicone – tudo atóxico, como se fosse a massa de um bolo. Vai para o forno, e aí saem as peças”, diz.

Depois vêm pintura, colocação de olhos, ímã para chupeta, implante de cabelo e montagem do corpo. “É tudo artesanal. A pintura e o cabelo são feitos à mão. Um bebê leva em média quatro dias para ficar pronto”, diz Tiago.

Eles oferecem desde modelos mais simples – os mini reborn de R$ 200 – até bonecos mais sofisticados, como os de silicone sólido, que são maciços, mais pesados e realistas em torno de R$ 3.000. “Eles imitam até a textura da pele humana. São bem mais caros, porque o material e o processo são diferentes”, afirma.

Para Tiago, a produção nacional barateou o custo e adaptou o produto ao gosto brasileiro. “Aqui no Brasil, as crianças querem dar banho nos bonecos. Lá fora não têm essa cultura. Por isso, desenvolvemos corpos de vinil.”

No quiosque Berçário Mágico, no Grand Plaza, o nascimento do bebê é cheio de rituais. “A criança escolhe o bebê, dá nome, escolhe a roupinha. A ‘enfermeira’ faz o teste do pezinho, pesa, mede, carimba no livro do bebê e entrega a certidão de nascimento. Cria-se um vínculo na hora. Elas saem um pouco de celular e criam rotina”, afirma.




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